Ricardo Lopes

Quo Vadis Académico?

Em Viseu vive-se mais uma época de tristeza. O Académico de Viseu Futebol Clube, maior representante da cidade no que ao futebol diz respeito, dedica-se novamente à luta pela manutenção, tendo somente duas vitórias em 2022, uma contra o Casa Pia, uma das equipas mais fortes da Segunda Liga e a outra frente à Académica de Coimbra, última classificada. Os números de 2021/2022 não são nada agradáveis, com sete vitórias, seis empates e dezasseis derrotas, nos vinte e nove jogos realizados. Foram marcados vinte e três golos e sofridos quarenta e três. A média de golos é inferior a um por jogo, o que revela muito a respeito da capacidade ofensiva da equipa. Na Taça, a eliminação frente ao Paredes, participante do Campeonato de Portugal, levou a que o CAF se despedisse na Terceira Eliminatória da Prova Rainha, sendo que em 2019/2020 chegou às meias finais, onde foi eliminado pelo FC Porto, com o encontro no Fontelo a ser realizado num ambiente incrível. Com a viragem do ano saiu Zé Gomes e entrou Pedro Ribeiro, que houvera sido despedido dias antes pelo FC Penafiel, mas as mudanças nos resultados foram poucas. O vimaranense ganhou dois jogos (os referidos anteriormente), enquanto que no antigo clube venceu nove. Além dos resultados negativos, o futebol praticado é fraco, desagradável de ver e extremamente pachorrento, levando à impaciência dos adeptos, verificada tanto nos estádios, como nas redes sociais, onde todas as semanas são geradas críticas, tanto em posts, como em comentários. O estilo de jogo não é exclusivo das últimas partidas, mas sim algo recorrente desde o inicio da época. Tanto um como o outro técnico apresentaram uma variedade de táticas (3-4-3, 4-4-2,4-2-3-1, 4-3-3 etc.) que leva a que não haja uma estabilização. Os jogadores têm tarefas distintas nos diferentes modelos táticos, não criando rotinas nem hábito às instruções, impossibilitando melhoras. Acrescenta-se a isto, o facto de muitos dos atletas não terem competência para atuar em todas as estruturas já utilizadas (algo que não é exclusivo dos atletas do Académico, afeta todos os futebolistas no geral).

O plantel foi montado de uma maneira débil, aparentando uma dependência da colocação de ativos por empresários, exibindo uma falta de visão de mercado. Muitos dos jogadores não têm a qualidade necessária para representar o emblema e outros praticamente não contam. Çakar e Gril chegaram do Hoffenheim (com uma clara influência de Mariano Maroto López), mas só o guarda redes se mostrou uma mais valia, quando havia expectativas elevadas pelos dois. Do mercado de Verão poucos nomes têm feito a diferença, sendo a maioria das aquisições realizadas na parte final da pre-época. Há espaço para elogios a Nussbaumer, Vítor Bruno, Quizera e Gril, porém outros revelaram certa incapacidade, mesmo com muitas oportunidades. Na mesma divisão há jogadores de qualidade superior, sendo o plantel um dos mais pobres da Segunda Liga. Os atletas que chegaram em Janeiro não acrescentaram no imediato nada de novo, mesmo apresentando alguma experiência. Isto leva a questionar-se a contratação de Pedro Bessa, para a função mais importante da área das transferências e do mercado. O trabalho desempenhado em Vila Franca de Xira foi fraco e insuficiente para manter o UD Vilafranquense na Segunda Liga (mais tarde foram repescados). Qual é a ideia de contratar um Diretor Desportivo para ajudar salvar uma equipa da despromoção (como objetivo a curto prazo), quando este fracassou na temporada anterior com a mesma missão? Não está em causa a integração de Pedro Bessa na estrutura academicista, mas torná-lo o responsável máximo de um departamento leva à criação da dúvida sobre essa atitude, principalmente na cabeça do adepto.

 A aposta na formação continua a ser nula, somente com Miguel Sena a ser utilizado por duas ocasiões, não fazendo pior que os habituais titulares. Não faria mais sentido colocar mais elementos da formação nos treinos e convocatórias? Foram contratados jogadores que não estão a jogar nem a contribuir para a evolução da equipa. Para “fazer plantel”, elementos oriundos das camadas jovens podem desempenhar esse papel, podendo surgir alguma agradável surpresa e com custos bem mais baixos. Com os setores altamente debilitados, fica mais complicado ultrapassar a espinhosa missão de somar os pontos suficientes para não cair de divisão.

A somar a tudo isto, estar toda a época a jogar em Aveiro leva a que os sócios e adeptos não consigam acompanhar o seu clube. O ambiente que poderia criar-se no Fontelo dificultaria muito mais os adversários, já que a quantidade de viseenses presentes no estádio seria maior. É difícil para o comum simpatizante entender porque é que Seleções Portuguesas podem atuar no estádio, mas o Académico não. Mais difícil de compreender é a demora das obras realizadas e como não existe uma pressão por parte da Direção de modo a que ocorresse uma aceleração das mesmas. Estas começaram a 15 de Março de 2021 e estão para durar. Fernando Ruas não se quis comprometer com uma data para as mesmas terminarem, empurrando a culpa para António Costa. Jogar um ano inteiro como “visitante” não é agradável para ninguém, muito menos para os adeptos do Académico que eram presença assídua no Fontelo. Realizar uma hora de viagem para assistir a uma partida não é uma tarefa barata, tornando-se completamente impossível em certos horários praticados.

Há notoriamente problemas no presente, mas se começarmos a olhar para o futuro surgem novas questões (e nuvens negras) aos sócios e simpatizantes do Académico. Quais são os objetivos para o futuro? A ideia é um projeto sustentável (com um crescimento gradual) para levar os adeptos a sonhar ou ficar-se pela luta da manutenção (caso se integre a Segunda Liga em 2022/2023)? Para a montagem do plantel vai-se aplicar a mesma política? Na minha opinião terá que existir uma maior capacidade de atuar no mercado. Embora exista a consciência de que somente podem chegar jogadores a “custo zero” ou emprestados, há mercados que têm que ser explorados com mais qualidade. Em Portugal a Terceira Liga tem uma série de jogadores preparados para dar o salto, assim como no Campeonato de Portugal, podendo ser duas fontes de reforços. Mercados emergentes são outra opção cada vez mais vista em Portugal, algo que pode ser explorado pelo scouting do Académico. Mariano Maroto López poderá convencer alguns elementos oriundos da Alemanha (especialmente do Hoffenheim) a contribuírem para o sucesso viseense, evitando trazer jogadores que praticamente não serão utilizados. A política contratual a ser aplicada terá de ser distinta (ainda que nos últimos anos tenha sofrido melhoras). Contratos de um ano são para evitar, nomeadamente em atletas com potencial reconhecido e com uma idade de crescimento. Claro que para isto acontecer seria necessária uma reforma na estrutura do clube, trazendo pessoas com maior capacidade e que olhem para o Académico como uma instituição cheia de potencial (porque o é) e com vontade de a fazer crescer, com um bom conhecimento futebolístico e vontade de trabalhar.

A liderança da equipa técnica vai ser fundamental para o futuro do clube. Pedro Ribeiro, embora não tenha a culpa inteira “nas suas costas”, está a mostrar-se mais parte do problema do que da solução. O futebol tem sido miserável, sempre conotado de uma maneira negativa. Estando em vantagem, a decisão é sempre a mesma: defender o resultado. O resultado dessa atitude está à vista. O discurso é sempre o mesmo, agarrando-se à falta de sorte, mesmo quando os jogos são altamente desequilibrados. 2022/2023 terá que trazer um novo técnico, independentemente da situação em que o CAF esteja.

Um outro prisma que levanta questões é a aproximação do clube à cidade. Se este ano é natural que existam poucas pessoas no Municipal de Aveiro, os jogos em 2022/2023 já vão ser em Viseu. O problema é que nas épocas anteriores as casas apresentadas não eram muito “famosas”. Além disso eram sempre as mesmas caras que figuravam no estádio, o que mostra um certo desinteresse pelas pessoas da cidade pelo seu principal clube. Estará em mente alguma política para trazer mais adeptos ao Fontelo? Há uma série de medidas que podem ser aplicadas para atrair público, principalmente os mais jovens. Acordos com escolas, descontos nos bilhetes, presença de jogadores para autógrafos (na Loja Oficial, dando-lhe alguma utilidade, como já ocorrera no passado) são exemplos simples de o clube marcar presença e chamar a atenção, envolvendo a população. Há que tornar apelativa a ideia de ir “ver a bola” com a família e/ou amigos no Fontelo. Seria altamente recomendável dar uma nova vida a projetos interessantes levados a cabo pela área da Comunicação. Programas como o “Regresso ao Passado” ou o “Conecta-te à formação” têm tudo para ser um sucesso, se bem executados e com a devida publicidade. O contacto entre adeptos e clube é cada vez mais fundamental, tanto pessoalmente como digitalmente, levando igualmente à aproximação das empresas da região. Em Viseu há bons exemplos disto.

Relativamente às camadas jovens, existe algum plano para manter as boas promessas que existem? De tornar o Académico de Viseu a equipa mais forte da região, com um bom recrutamento e capacidade de “seduzir” os jogadores das outras equipas a assinarem pela equipa do Fontelo? Claro que o projeto de tornar o clube líder na formação regional teria que ser executado a longo prazo, mas tornar-se-ia mais simples se existisse uma aposta na equipa principal (evitar casos como o de André Lacximicant é obrigatório, afinal os 275 mil euros que o Leixões SC recebeu por ele, fazem falta ao Académico). Com a crise criada pela pandemia e “engrossada” pela guerra, o setor futebolístico não vai ser uma exceção às vítimas, tornando a prata da casa cada vez mais importante para a definição de um projeto vencedor.

Em relação à Direção, será de maneira assídua a presença do Presidente da SAD em Viseu? Parece-me obrigatória a ideia de que Mariano Maroto López tenha que se envolver muito mais no dia-a-dia do clube. Existem muitos exemplos em Portugal de clubes com uma SAD nas mãos de estrangeiros onde o resultado foi profundamente negativo. Decerto que os academicistas não quererão uma repetição neste caso. A figura máxima do futebol de um clube tem de estar sempre presente, nos momentos maus (para justificar as suas opções) e nos momentos bons (para celebrar, porque tem parte do mérito nas vitórias). Dar-se a conhecer aos adeptos e à cidade é fundamental para o seu sucesso, dando entrevistas e estando pelas ruas de Viseu.

É cada vez mais fácil estar em Viseu e ouvir críticas ao Académico. Em qualquer café/parque/esplanada o assunto da “depressão” que o clube vive é discutido, com mais ou menos rigor. Parece bem mais simples apoiar outras equipas como o Viseu 2001 (sem dúvida a instituição que mais cresceu nos últimos anos, na cidade) ou o Lusitano FCV ou até mesmo o CD Tondela, que embora não sendo da capital, está a assumir-se cada vez mais como o grande clube da Beira Alta. É hora do Académico de Viseu decidir o que quer: ser mais um ou voltar a ser o mais preponderante da região.

Artigo de Ricardo Lopes – Mestre em Estudos Avançados e Investigação em História